Artigo: Por que não tentar ser perfeito é algo importante para as crianças saberem

Por que não tentar ser perfeito é algo importante para as crianças saberem
Nos últimos anos, psicólogos e pedagogos têm chamado a atenção para um aumento expressivo nos diagnósticos relacionados à ansiedade e à depressão em crianças e adolescentes.
Uma das causas de tudo isso é a cultura da comparação e da exigência, muito amplificada pelas redes sociais e por ambientes escolares cada vez mais competitivos.
Isso porque, quando a criança cresce ouvindo que deve ser a melhor em tudo que fizer, que não pode errar ou que precisa se esforçar sempre mais para atender a expectativas altas, ela internaliza a ideia de que o amor e o reconhecimento estão condicionados totalmente ao seu bom desempenho.
Mas, o problema é que este ciclo vai gerar medo de falhar, vergonha exagerada diante de erros e até resistência em tentar coisas novas — já que o risco de não atingir a perfeição se torna paralisante.
O peso da perfeição na infância
Errar não é o oposto de aprender; muitas vezes, é justamente o caminho que abre espaço para o aprendizado real. Porém, alguns pais e responsáveis acabam esquecendo ou ignorando essa verdade ao cobrar perfeição em tudo.
Desse modo, quando, por exemplo, uma criança esquece a lição de casa, derruba um copo de leite ou não consegue montar um quebra-cabeça, ela não está falhando deliberadamente.
Na realidade, situações como essas são grandes oportunidades para ensinar sobre possíveis correções de erros, resiliência e paciência.
Portanto, em vez de punir ou supervalorizar falhas assim, os pais ajudam mais quando mostram que cada erro carrega junto uma lição.
Ainda usando os exemplos acima, seria possível conversar com a criança sobre como organizar melhor seu tempo para fazer o dever; como segurar objetos com mais cuidado evitando que caiam, e explicar como dividir um problema em partes menores para finalizar o quebra cabeças aos poucos.
É justamente essa lógica que ajuda na construção de pessoas menos rígidas consigo mesmas e mais preparadas para lidar com as frustrações inevitáveis da vida adulta.
Então, como falar sobre perfeição infantil do jeito certo?
O grande desafio para os pais é encontrar formas de ensinar sem cair em discursos vazios e sem provas. Nossa sugestão é seguir uma linha mais ou menos assim:
- Compartilhar histórias reais de falhas: quando os pais contam episódios em que erraram de verdade, mas conseguiram aprender e seguir adiante, a criança entende mais facilmente que a imperfeição é parte da vida, alcançando até mesmo aqueles que mais amam - e assim como eles poderá aprender com seus erros.
- Valorizar o processo, não só o resultado: elogie o esforço, a dedicação e a coragem de tentar, mesmo que o resultado não tenha sido o desejado, pois essa é uma ótima forma de demonstrar que você não espera ter um filho perfeito - e que o ama independentemente do seu alto desempenho.
- Dar espaço para erros de forma segura: dê autonomia às tarefas do dia a dia — arrumar o quarto, escolher a roupa, preparar um lanchinho — sabendo que erros vão acontecer, mas sem puni-los de forma desproporcional.
- Mostrar exemplos reais que vão além da sua casa: compartilhe histórias de artistas e líderes famosos que falharam muitas vezes antes de alcançar algo realmente grande. Costuma ser muito inspirador.
A relação entre a cobrança por filhos perfeitos e a saúde mental infantil
Pesquisas da American Psychological Association (APA) mostram que o perfeccionismo infantil se relaciona com quadros de ansiedade, procrastinação, autocrítica exagerada e até burnout em adolescentes e jovens adultos.
Em outras palavras, o impacto da pressão pela perfeição desde cedo não é algo passageiro, pois pode marcar e afetar negativamente o desenvolvimento da personalidade da criança.
Por outro lado, crianças que aprendem a lidar corretamente com falhas desde os primeiros anos, demonstram também lidar melhor com suas emoções, mantendo uma visão mais positiva da vida e de si mesmas.
E vale dizer que esses pequenos não deixam de buscar a excelência enquanto crescem, mas entendem que alcançar isso pode envolver erros durante o caminho, mas o que importa realmente é ter capacidade de se levantar após cada tropeço.
A escola também pode ajudar nesse processo
Se dentro de casa a criança não sente medo de errar e aprender, mas na escola enfrenta grandes exigências sem espaço de falhas, a mensagem se perde.
É por isso que os educadores precisam discutir sobre metodologias de ensino que valorizam o aprendizado contínuo e não apenas notas finais. Os pais, podem auxiliar levando a pauta para as reuniões escolares.
Agir assim não diminui a disciplina necessária no ambiente escolar, mas humaniza a educação e cria um ambiente mais saudável para crianças de todas as idades.
Como a cultura digital piora a pressão pelo perfeccionismo infantil
Além da escola e da família, há um terceiro agente que influencia bastante na forma como a criança lida com imperfeições: o universo digital.
Redes sociais, vídeos curtos e aplicativos repletos de filtros e edições passam uma mensagem sutil, mas com poder real: o ideal é sempre parecer impecável.
Crianças que têm acesso desde cedo a esse ambiente podem absorver indevidamente a ideia de que falhas devem ser escondidas ou editadas, porque erros não têm espaço.
Por isso, uma das atitudes mais importantes para combater essa ideia é mostrar que a vida fora das telas tem muito mais verdade — e é imperfeita.
Compreender as imperfeições humanas forma a base necessária para vários aspectos da vida
A capacidade de se recuperar de erros e frustrações é uma das competências mais valorizadas na vida adulta, tanto no aspecto pessoal quanto profissional.
Logo, ensinar isso desde a infância significa preparar seu filho para os inevitáveis "nãos" que encontrará ao longo da vida: desde não passar em uma prova até não conseguir o emprego dos sonhos.
Quando os pais reforçam em casa que não ser perfeito é humano - e é aceitável - a criança se motiva para levantar mais rápido, bem como a tentar novamente e a buscar soluções diante dos seus desafios.
Essa é a essência da resiliência — e um dos maiores presentes que uma boa educação pode oferecer.
4 formas de aplicar essa lição no dia a dia
- Deixar que a criança escolha uma atividade nova em que nunca teve experiência (como aprender a andar de skate, cozinhar ou pintar) e encarar juntos o trajeto do aprendizado cheio de tentativas e erros.
- Transformar erros em perguntas, em não em críticas: “O que você acha que poderia fazer diferente da próxima vez?”.
- Reforçar frases como “todo mundo erra”, “ninguém nasce sabendo” ou “errar também é aprender”.
- Reconhecer os próprios erros diante da criança, mostrando na prática que nem os adultos experientes e com mais conhecimento são perfeitos.
Quando os pais adotam essas pequenas atitudes no dia a dia, a criança sente que pode se arriscar, explorar novas ideias e testar suas próprias capacidades sem o peso constante do medo de errar.
E é nesse tipo de atmosfera que seu filho aprende de verdade, cresce confiante e se sente encorajado a seguir seus próprios caminhos, sabendo que, mesmo que algo dê errado, terá apoio e compreensão para tentar de novo.
